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Ary dos Santos

(N. 7 dezembro, 1937 - M. 18 janeiro, 1984)

José Carlos Pereira Ary dos Santos tornou-se conhecido do grande público como um dos mais talentosos poetas da sua geração, contribuindo para a renovação da música ligeira portuguesa, através dos seus poemas, que considerava serem a sua maneira de falar com o povo porque ser poeta é escolher as palavras que o povo merece.

Filho mais velho do médico Carlos Ary dos Santos e de Maria Bárbara de Castro Pereira, José Carlos Ary dos Santos nasceu em Lisboa, a 7 de Dezembro de 1937. O casal teve mais duas filhas, Maria do Rosário e Maria Isabel, e um filho, Diogo. Quando é ainda adolescente a sua mãe falece e o pai volta a casar. Dessa relação nasce a sua meia-irmã Ana Maria.

Iniciou a sua instrução no Colégio Infante Sagres mas, tendo sido expulso por mau comportamento, passou para o Instituto Nuno Álvares, um colégio interno em Santo Tirso. Mais tarde regressou aos estudos em Lisboa, no Colégio São João de Brito, no Lumiar. Apesar de não ter terminado nenhum curso superior frequentou as faculdades de Direito e de Letras de Lisboa.

Ary dos Santos inicia-se muito cedo na escrita de poesia e quando soma apenas 14 anos, em 1953, a sua família, contra a sua vontade, publica o seu primeiro livro, de título “Asas”.

A sua personalidade rebelde leva-o a sair de casa com apenas 16 anos e, para fazer face às despesas de sobrevivência, passa por vários empregos como vendedor de máquinas de pastilhas elásticas, paquete na Sociedade Nacional de Fósforos ou escriturário no Casino Estoril. Em 1958 Ary dos Santos inicia uma carreira na área da publicidade, onde terá bastante êxito fruto da sua grande criatividade aplicada nos slogans publicitários.

Paralelamente, continuará a escrever os seus poemas e, no ano de 1954, é reconhecida a qualidade dos seus escritos com a selecção de alguns dos seus poemas para a Antologia do Prémio Almeida Garrett, ladeando com nomes consagrados da poesia portuguesa.

A sua estreia efectiva dá-se em 1963 com a publicação do livro de poemas “A liturgia do sangue”. No ano seguinte é editado o “Tempo da lenda das amendoeiras” e o poema “Azul existe” que será representado no Tivoli, no Teatro da Estufa Fria e na RTP.

Ao longo da sua carreira, Ary dos Santos, foi sempre publicando livros de poemas, como: “Adereços, endereços”, em 1965; “Insofrimento in sofrimento”, em 1969; “Fotos-grafias”, um livro que foi apreendido pela PIDE, em 1971; “Resumo”, em 1973; “As Portas que Abril Abriu”, em 1975; “O Sangue das Palavras”, em 1979; e, em 1983, “20 Anos de Poesia”.

À data da sua morte, em 1984, tinha em preparação a obra “As Palavras das Cantigas”, que foi publicado pelas Edições Avante, em 1989, com coordenação de Ruben de Carvalho, e, também, uma autobiografia romanceada a que pretendia dar o título de “Estrada da Luz – Rua da Saudade”. Postumamente, em 1994, foi editada “Obra Poética”, uma colectânea dos seus poemas.

A teatralidade patente na sua voz vibrante encontra-se registada em várias edições discográficas, onde se apresenta como declamador. O seu primeiro disco, “Ary por si próprio” data de 1970. No ano seguinte participa no LP “Cantigas de Amigos”, juntamente com Natália Correia e Amália Rodrigues. Em 1974 surge “Poesia Política”, em 1975 “Llanto para Afonso Sastre y Todos”, em 1977 “Bandeira Comunista”, em 1979 “Ary por Ary” e, no ano seguinte, “Ary 80”, que será reeditado em CD em 1999.

Uma das componentes da vida do poeta Ary dos Santos é, também, a intensa actividade de militante político que o move pelo país, antes e depois da Revolução de 25 de Abril, apoiando pessoas e causas. Ary dos Santos inicia-se activamente na vida política em 1969. Nesta altura integra a campanha da Comissão Democrática Eleitoral e filia-se no Partido Comunista Português.

As extraordinárias capacidades criativas de Ary dos Santos estiveram também patentes na área que lhe logrou maior sucesso e popularidade junto do grande público, a de autor de poemas de canções e Fados.

Em 1969 concorre, sob pseudónimo ao Festival da Canção, com o poema “Desfolhada”. Com música de Nuno Nazareth Fernandes e interpretação de Simone de Oliveira, esta canção alcança o primeiro lugar. A música é editada em disco e apresentada repetidamente na rádio e na televisão, bem como em espectáculos por todo o país.

O poeta voltará a arrebatar o lugar de vencedor do Festival da Canção nos anos de 1971, novamente em parceria com Nuno Nazareth Fernandes, com a interpretação do poema “Menina” por Tonicha; e em 1973 e 1977, com composições musicais e interpretações de Fernando Tordo, primeiro com o tema “Tourada” e depois com “Portugal no Coração”.

José Carlos Ary dos Santos é autor de mais de 600 poemas para canções colaborando assiduamente com vários compositores, dos quais destacamos os já referidos Nuno Nazareth Fernandes e Fernando Tordo, mas também Alain Oulman, José Mário Branco, Paulo de Carvalho ou António Victorino de Almeida.

No que diz respeito à sua ligação ao Fado, a mesma será iniciada com a interpretação de José Manuel Osório, em disco editado em 1967, do poema “Desespero”, publicado no livro “Liturgia de Sangue”, de 1963.

Posteriormente escreverá especificamente para vários fadistas e terá colaborações muito regulares com Amália Rodrigues e Carlos do Carmo.

A convite de Alain Oulman escreve, em 1968, o poema “Meu amor meu amor” para ser interpretado por Amália Rodrigues. Seguiram-se temas como “Amêndoa Amarga”, "Alfama", "Rosa Vermelha", “O Meu é Teu" e "O Meu Amigo está Longe".

Representativos do grau de popularidade que os poemas de Ary dos Santos atingiam junto do grande público são temas como “Estrela da Tarde”, “Lisboa, Menina e Moça” ou “Os Putos”, interpretados por Carlos do Carmo, com músicas de Fernando Tordo e Paulo de Carvalho.

Mais importante é o facto do seu nome estar ligado a um disco, também do fadista Carlos do Carmo, que marcou a História do Fado, o LP “Um Homem na Cidade”, de 1977, inteiramente concebido com poemas de Ary dos Santos. O mesmo formato será aplicado no álbum “Um Homem no País”, editado em 1984, também com as letras do poeta, musicadas por vários compositores.

Ainda no âmbito da sua criação de poemas interpretados por fadistas, Ary dos Santos escreverá “Adagio”, em 1973, para a música “Adagio” do compositor Albinoni, a qual foi interpretada por Teresa Silva Carvalho; “Meu Corpo”, em 1974, para o repertório de Beatriz da Conceição; o poema “Roseira, botão de gente”, interpretado por Vasco Rafael na revista “Ó da Guarda”, de 1977; o tema “O País”, de 1981, cantado por Tony de Matos; e os temas “Mãe Solteira”, “Fado Mulher”, “Os Pinheiros” e “A Cidade”, escritos no início da década de 1980 para a fadista Maria Armanda.

A 18 de Janeiro de 1984 faleceu o poeta José Carlos Ary dos Santos, vítima de uma cirrose cuja causa reside no facto de beber regularmente grandes quantidades de gim. Foi sepultado no cemitério do alto de São João.

Homossexual assumido, viveu praticamente toda a sua vida no nº23 da Rua da Saudade, pelo que, postumamente, o seu nome foi dado a um largo do Bairro de Alfama, e descerrada uma lápide evocativa nessa casa da Rua da Saudade.

 

Fonte:

Carvalho, Ruben, 1993, “José Carlos Ary dos Santos: As Palavras das Cantigas”, Lisboa, Edições Avante;

Marques, Paulo, 2008, “José Carlos Ary dos Santos”, Col. “Cadernos Biográficos”, Vol. 7, Lisboa, Parceria A. M. Pereira/Público.

Ary dos Santos, s/d.

Maria da Fé e Ary dos Santos Tipóia, 1970

  • Fado do Campo Grande Carlos do Carmo (Ary dos Santos / António Vitorino de Almeida)